Por Alberto da Cunha Melo
Sempre posto em
desassossego, começo a folhear Poemas Escolhidos, de
Jorge de Lima, publicado em 1932 por Adersen-Editores, com belíssima capa em estilo art noveau de Manoel (com o) Bandeira, conterrâneo do Manuel (com u) Bandeira. O
nome da editora me pareceu estranho. A José Olympio, a que mais fez pela literatura brasileira, até hoje, só seria criada
em 1934. Suspeito que o dono da editora seja um daqueles antigos livreiros, de
que fala Darcy Ribeiro, que na década de vinte do século passado começaram a editar
e imprimir livros no Brasil. A grande maioria era de imigrantes ou seus
descendentes, como Bertaso, Briguiet, Garnier, Garroux, Laemmert, Leuzinger,
Plancher, Pongetti e Vecci, entre tantos outros.
Poemas Escolhidos não é
o melhor livro do autor, mas é uma espécie de antologia de sua primeira fase
pós-parnasiana, com temática popular e folclórica, prefácio entusiástico de
José Lins do Rego, e onde estão alguns dos poemas de Jorge de Lima que mais
admiro, como "Pai João", "Madorna de Yayá", "Essa Negra
Fulô", "Inverno", "Boneca de Pano", "Poema das
Duas Mãozinhas" e "Cantigas". Mas, não estou agora preocupado
com a grande obra do poeta alagoano. O que me deixou perplexo foi saber -
porque está lá impresso – que um livro de poesia, de um poeta novo, com apenas
37 anos, publicado no Brasil, em 1932, tivera uma edição de 5000 exemplares.
Sabendo, de antemão, que Manuel Bandeira publicara, em 1917, o seu Cinza das
Horas, numa humilde edição de duzentos exemplares. Quanto a mim, com 61 anos,
meu último livro, Meditação sob os Lajedos, teve apenas 450 exemplares.
Entrevistada pelo poeta
Mário Hélio, em 1999, a diretora editorial da Record, Luciana Villas-Boas disse que “o livro no Brasil é caro, porque só
uma elite lê”, e que a média de tiragem de sua editora é de dois a três mil
exemplares, enquanto nos Estados Unidos nenhuma primeira edição “seja lá do que
for”, nunca é menor que vinte mil exemplares. Por tudo isso me espantou a
edição de 5000 exemplares dos Poemas Escolhidos, pela misteriosa editora carioca Adersen-Editores. Tudo indica que a poesia foi, ao longo do
tempo, perdendo prestígio, neste país. E, quanto mais refinada, mais corre o
risco do desprezo editorial. Entrevistado pelo jornal eletrônico Agulha, Cláudio Willer disse que “a tiragem média de
livros de poesia no Brasil é exatamente a mesma de Porto Rico, país cuja
população equivale a 2% da brasileira”. Que diabo o brasileiro tem contra a
poesia? Não seria falta de publicidade? Porque a mídia vende até merda
enlatada.
Conversando com meu amigo,
o sociólogo Pedro Vicente Costa Sobrinho, que dirige editoras desde a
juventude, ele me informou que “a poesia tem-se tornado uma arte marginal no
mercado editor: os livros de poesia, ou são publicados por iniciativa do
próprio poeta ou com o apoio de órgãos públicos”. Cada vez mais me convenço de
que estou certo quando digo, nas entrevistas, que a poesia é uma
antimercadoria. Essa história da Internet de que, no Japão, os poetas de
qualidade têm edições de cem mil exemplares, eu só acredito vendo e não tenho
dinheiro para ir lá ver. O exemplo editorial da Adersen-Editores, que homenageio neste artigo, é bastante significativo da visão
humanística daquela estranha empresa, que em sua “Nota dos Editores”, finaliza
dizendo: “estamos certos de prestar um grande benefício às letras pátrias,
oferecendo ao público uma preciosa antologia da obra moderna desse grande poeta
moço, que honra a literatura de todos os tempos no Brasil”. O tempo e a crítica
se encarregaram de comprovar o acerto do investimento.
O desprezo pela poesia
não se limita apenas às editoras comerciais do Brasil, todas elas mesquinhas e
tão desatenciosas que não dão satisfação aos autores sobre os originais que
lhes mandam, gastando dinheiro com cópias e postagem. Pedro Vicente me chamou a
atenção para o fato de nos catálogos das editoras universitárias, como a UNESP,
UNB e USP, não constarem títulos de poesia. Mas esse menosprezo pelas musas não
é generalizado no universo das editoras universitárias, basta lembrar os
exemplos das Editoras da UFPE e da UFRN, com muitas obras publicadas, a maioria
delas por iniciativa do poeta César Leal e do próprio Pedro.
Mas, no Brasil, não é
somente a poesia que é desprezada. O próprio livro é um objeto de luxo a que
poucos têm acesso. Segundo o presidente da Câmara Brasileiro do Livro, Raul Wassermann, a média de leitura per capita, no Brasil, é de um
título por ano, enquanto nos países desenvolvidos chega a 15. O que se pode
esperar de um país onde 89% dos seus 5.700 municípios não têm livrarias?
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